No dia 2 de junho, aconteceu o lançamento em São Paulo do livro de Isadora Faber, Diário de Classe. Antes dos autógrafos, houve um debate com apresentação do jornalista Gilberto Dimenstein e participação de Isadora, do educador Gil Giardelli e do professor de História do Colégio Santa Cruz, Marco Cabral.
Gilberto começou perguntando por que ela resolveu transformar a página do Facebook “nessa coisa careta” que é um livro. Isadora deu a resposta natural de que um livro é algo muito mais duradouro, permanente que uma página de Internet.
Gil Giardelli é o autor do prefácio de Diário de Classe. Ao ler, fiquei incomodado com uma referência meio gratuita ao caso do menor delinqüente que foi preso a um poste com uma tranca de bicicleta. Ele escreveu “A educação nos livra dos grilhões e nos ensina a não amarrar pessoas em postes.” OK e a educação também nos ensina a não cometer crimes. Fiquei mais incomodado ao ouvi-lo dizer, no debate: “Vamos se posicionar” (sic). Sinto uma reação quase física, corporal, quando um educador comete um erro de português. Mas o pior foi quando ele disse, sobre a geração “nem-nem” (nem trabalham, nem estudam), que “a culpa não é deles”. A culpa seria da educação que receberam, ou algo assim.
Não sei nada sobre o Colégio Santa Cruz. Pelo que ouvi no debate, pareceu ser uma escola muito ruim. O professor Marco Cabral disse que o Colégio considera que seu cliente não são os alunos ou seus pais, mas a sociedade como um todo. Eu não colocaria meus filhos em uma escola que considerasse que o cliente dela não somos meus filhos e eu.
Na maior parte do tempo, quem falou foram os três. A senhora que estava ao meu lado na platéia reclamou várias vezes que estava lá para ouvir a Isadora. A autora do Diário é muito simpática, mas também é muito tímida. Gilberto Dimenstein parecia querer constrangê-la, ao invés de tentar deixá-la mais à vontade, por exemplo falando repetidas vezes sobe a timidez dela.
O mais impressionante da história do Diário de Classe não foi o fato de ter começado, mas de ter continuado e chegado até onde chegou. Isadora mostrou que o rei estava nu. E continuou afirmando isso, apesar de toda a pressão, de ameaças, de boletins de ocorrência, de processos judiciais, de pedras jogadas contra sua casa que feriram sua avó. Ela não teve a solidariedade de quase ninguém dentro da Escola Básica Municipal Maria Tomázia Coelho. Comentando exatamente isso, o professor Marco Cabral citava a falta de instrumentos de democracia direta. Falei para a senhora a meu lado que, se houvesse democracia direta por lá, Isadora seria crucificada na quadra.
Uma informação importantíssima é que, segundo Isadora, as coisas estão voltando a ser como eram antes na Escola Básica Municipal Maria Tomázia Coelho, agora que ela se formou no ensino fundamental e mudou de escola. A mãe dela, que foi chamada ao palco, disse que foi a formatura mais comemorada da história da escola. Gilberto Dimenstein perguntou se Isadora preferiria ter estudado em uma escola privada. Ela respondeu que o ensino teria sido melhor, mas ela não teria tido a oportunidade de fazer o que fez e de aprender tudo o que aprendeu.
Ao final, Gilberto convidou as pessoas da platéia a participar do debate. Fiz duas perguntas. Primeiro, se depois de toda essa experiência difícil, de todos os problemas e de toda a falta de apoio, ela não chegava a sentir que a escola pública é simplesmente inviável. Segundo, mencionei a foto dela com A Revolta de Atlas, de Ayn Rand, nas mãos. Perguntei se ela leu alguma coisa de Ayn Rand e o que achou.
Isadora disse que leu A Revolta de Atlas e gostou. Gilberto pediu que ela falasse mais sobre o livro. Fiquei com a impressão de que ele não fazia idéia de quem é Ayn Rand. Ela só disse que ganhou o livro de um jornalista e que era muito bom. Sobre a escola pública, Isadora fundou uma ONG para apoiá-la. Não, ela não acha que a escola seja inviável.
Um pai, na platéia, contou que tinha filhos numa escola municipal em São Paulo e que a escola substituiu as festas de Dia das Mães e Dia dos Pais por uma festa “da pessoa que cuida de mim”. Ele havia proposto à escola que fizessem uma festa a mais, mas não cancelasse as outras festas, mas a escola não aceitou. Um amigo meu, nessa hora, disse para mim que o cara devia ter lido a história no Reinaldo Azevedo e estava contando como se tivesse acontecido com ele. Então, o pai disse que levou essa reclamação para vários lugares e que o Reinaldo Azevedo publicou a história dele. Queria muito ter conseguido conversar com esse pai. Ele disse que era carteiro e estava cursando graduação em História. Infelizmente, não o vi mais quando saímos do auditório.
A última pergunta do Gilberto para a Isadora foi sobre como ela imagina que será a vida dela daqui a dez anos. Ela respondeu: “Nem sei o que pode acontecer daqui a um ano.” Foi vivamente aplaudida.
Conversei um pouco com a mãe da Isadora depois de pegar meu autógrafo. Ela disse que as portas de todas as escolas municipais de Florianópolis estão fechadas para a ONG Isadora Faber. O fato é que o atual prefeito, Cesar Souza Junior, do PSD, quando candidato, usou sem autorização a imagem de Isadora em sua campanha, para atacar a administração anterior. A família de Isadora moveu um processo contra ele.
Como já escrevi antes, independentemente do que Isadora faça daqui para frente, de suas escolhas políticas ou das pessoas a quem ela se associe, admiro muito o que ela fez, sua coragem e determinação. Sua história é a história de um indivíduo lutando contra os abusos de poder das autoridades constituídas, usando como ferramenta apenas sua liberdade de expressão. Eu gostaria de ser Isadora Faber.
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