Cláudio Sampaio, falando sobre impressoras 3D |
Estive no segundo dia da Embedded Systems Conference 2014. Infelizmente, não pude estar no primeiro. Foi a quarta edição do evento, composto por uma feira e um conjunto de palestras.
A feira é bem pequena, bastante focada no desenvolvimento de sistemas embarcados. Mostra algumas novidades e traz informações interessantes, mas o principal é encontrar os amigos que trabalham nesse ramo. As palestras são variadas, desde treinamentos específicos sobre tecnologias determinadas até apresentações muito originais sobre pesquisas ou tecnologia de uma maneira bem geral.
Jon "Maddog" Hall, presidente da Linux International |
Assisti a cinco palestras, buscando principalmente assuntos sobre os quais sei pouco. A primeira foi sobre impressoras 3D, com Cláudio Sampaio, da Patola. Aprendi que o principal projeto de impressora 3D foi patenteado em 1989 e essa patente durou 20 anos. Quando expirou, em 2009, os preços das impressoras 3D caíram para um nível cerca de 100 vezes mais baixo. As pessoas se prepararam para a queda dessa patente, formando uma comunidade de desenvolvedores, nos moldes da comunidade do Linux. Outras patentes vem caindo de lá para cá, aumentando a quantidade de projetos sob domínio público. É possível criar os mais diversos tipos de peças, objetos e dispositivos usando impressoras 3D. Um modelo básico custa hoje cerca de US$ 3.500,00 nos Estados Unidos, possibilitando que qualquer americano médio tenha uma em casa. Em breve, qualquer brasileiro médio também terá a sua.
Luke Dubord, da NASA |
A segunda palestra foi com o Keynote Speaker Luke Dubord, da NASA, falando sobre a Curiosity. Ele explicou várias das dificuldades que envolvem uma missão a Marte. Esse planeta se aproxima da Terra uma vez a cada dois anos. Nessas ocasiões, há uma janela de cerca de duas semanas para se lançar um foguete. Se esse prazo for perdido, se alguma coisa não estiver pronta, esperam-se mais dois anos. O foguete demora mais de oito meses para chegar até lá. Marte está a uma distância aproximada de 14 minutos-luz da Terra. Qualquer informação da missão leva 14 minutos para chegar aqui. Qualquer comando para a missão leva 14 minutos para chegar lá. O pouso inteiro demora 7 minutos. Todos os sistemas precisam de extrema autonomia.
Luke explicou o complicado sistema que permitiu o pouso de uma sonda de 900kg. Baseando-se na idéia de um helicóptero carregando outro pendurado por cabos, pousando-o suavemente no chão e soltando os cabos, a NASA desenvolveu um equipamento propelido por foguetes no qual a Curiosity foi pendurada. Esse equipamento freou a queda, deixou a sonda no chão e chocou-se contra o solo a uma distância segura.
Ao final da palestra, perguntei se as fracassadas missões soviéticas não-tripuladas e as missões americanas que levaram as sondas Viking I e II não poderiam ter contaminado Marte com vida terrestre. Ele respondeu que o risco existe, mas ele acredita que seja muito pequeno. Disse que a NASA tomou muito cuidado para evitar isso. Não sabemos que cuidados tomaram os russos. Como as missões soviéticas todas fracassaram, talvez uma possível contaminação tenha sido destruída no pouso. Perguntei também se era verdade que a tecnologia das missões Apolo à Lua foi perdida e que a NASA não seria capaz hoje de refazer essa viagem. Ele disse que sim, seria necessário desenvolver novamente a tecnologia. Segundo ele, infelizmente houve uma decisão política, no final dos anos 70, de desfazer o programa Apolo.
A terceira palestra foi com o Professor Francisco Fambrini, que tem pesquisas com matrizes de microeletrodos para o estudo de sinais gerados por neurônios vivos, de ratos. Ele mostrou um sistema desenvolvido por sua equipe, para amplificação desses sinais e exportação para um PC via USB. Os sinais tem amplitude da ordem de 5 microvolts. Eles desenvolveram um soquete para a matriz de microeletrodos, para não terem de importar essa peça da Alemanha, a um custo de US$ 15.000,00. A versão nacional custa R$ 300,00. Desenvolveram e patentearam um circuito para simular a rede de neurônios e testar os circuitos amplificadores. Aparentemente, uma empresa alemã se interessou por esse dispositivo. Parece que a Universidade não tem interesse em comercializá-lo, não entendi bem por quê.
A quarta foi com o Fabio Estevam, da Freescale, sobre como contribuir com o kernel do Linux. Qualquer pessoa pode propor alterações ao kernel do Linux. Se forem consideradas úteis, são incorporadas à versão oficial corrente. As alterações podem ser bastante simples, como eliminação de warnings de compilação (o exemplo que ele fez durante a palestra foi assim) ou bem mais complexas, como o desenvolvimento de um device driver completo. Fabio mostrou o roteiro para contribuir com o Linux e deu algumas dicas sobre a etiqueta dos e-mails, por exemplo.
A palestra de Clive "Max" Maxfield |
A última palestra foi a mais interessante de todas. Robot Apocalypse: Trends in Embedded Systems, com Clive "Max" Maxfield. Max demonstrou, com um grande número de exemplos, como é difícil e ingrato tentar fazer previsões sobre o futuro. Os gregos, na Antigüidade, inventaram uma máquina a vapor. Mas não conseguiram transformá-la em algo útil. Ela teve de ser inventada novamente 2000 anos depois. O que seria do mundo se a República Romana tivesse essa tecnologia? Estamos completamente acostumados com celulares touch screen e acelerômetros. Parece que usamos essa interface desde sempre. O iPhone foi lançado em 2007. Não poderíamos imaginá-lo em 2006, há 8 anos.
Este chapéu com chifres ganhou o prêmio |
Existem dispositivos que são capazes de obter o conteúdo de uma conversa em uma sala pela análise das vibrações de uma folha de papel na sala, a partir de imagens dessa folha. Cada vez mais, nossas informações pessoais são conhecidas por empresas como Google e Facebook, que sabem a que horas acordam as pessoas que moram na minha rua, onde trabalham, de que tipo de música ou livros gostam, quem são seus amigos. As câmeras hoje são onipresentes. É cada vez mais uma realidade o reconhecimento de fala e de rostos, a sintetização da fala, os sistemas de inteligência artificial. As ameaças não são apenas de a tecnologia se voltar contra nós, mas também de a tecnologia ser subvertida por terroristas ou por um governo totalitário.
Ele propôs uma brincadeira ao público. Disse que talvez os robôs rebelados estivessem nos esperando do lado de fora da sala e que a única maneira de nos protegermos seria fazer chapéus de papel alumínio. Ofereceu R$ 250,00 para quem fizesse o melhor chapéu. Acho que todo o público participou, menos eu. Não queria perder nada de sua exposição.
Infelizmente, não pude conversar mais com o Max. Disse que gostaria de fazer algumas perguntas e ele respondeu que tinha de correr para tomar o avião. Quem sabe na próxima.