quinta-feira, 27 de novembro de 2014

Não é a mamãe, de Guilherme Fiuza

Ler Não é a mamãe: para entender a Era Dilma, de Guilherme Fiuza, foi um prazer masoquista muito semelhante ao que senti com Década Perdida, de Marco Antonio Villa. Foi até um pouco pior, porque li depois do resultado das eleições. Cada crônica é uma tragédia, uma oportunidade perdida pelo país. Sabemos que continuamos perdendo oportunidades todos os dias. Em cada coluna, a fina ironia nos força a rir das nossas desgraças.

O livro traz textos publicados em O Globo e na revista Época sobre a candidata e a presidente Dilma, do início de 2010 à metade de 2014. Cobre toda a primeira campanha eleitoral e quase todo o primeiro mandato. Como é possível que os brasileiros tenham escolhido uma figura tão vazia para o cargo eletivo mais importante do país? Como é possível que tenham tolerado bovinamente avalanches sucessivas de escândalos de corrupção e dado à presidente índices de popularidade estrondosos?

As crônicas expressam esse espanto. Em 2010, Dilma demonstra em um Congresso do PT sua total incapacidade de falar. Sua mediocridade é tamanha que os próprios militantes têm dificuldades de defender sua candidatura, mais ainda de se empolgar com ela. Repetidos crimes eleitorais acontecem, para os quais a Justiça Eleitoral faz vista grossa ou dá punições insignificantes. A campanha se desenvolve sobre mentiras. Emblemática da picaretagem é a apropriação da imagem de Norma Bengell na Passeata dos Cem Mil.

O blog oficial de Dilma Rousseff pegou esta foto:

Tonia Carrero, Eva Wilma, Odette Lara, Norma Bengell e
Ruth Escobar na Passeata dos Cem Mil

e fez esta montagem:


Guilherme Fiuza ressalta que Dilma é apresentada como uma heroína feminista, enquanto, na verdade, é o exemplo claro e acabado de uma mulher subalterna e subserviente a um homem que se comporta como seu dono. Dilma foi escolhida candidata porque Lula assim determinou. Em nenhum momento ela expressou qualquer opinião própria. O epíteto perfeito para uma pessoa sem conteúdo, segundo o autor, é “Mãe do PAC”. A expressão criada por Lula não significa nada e Dilma também não. “Não é a mamãe!”, diria o Baby Sauro.

Dilma é eleita e, no primeiro ano de governo, sete ministros caem. Seis por corrupção. Fernando Pimentel deveria ter sido o sétimo. Porém, Dilma conseguiu segurá-lo no cargo, enquanto preparava sua candidatura ao governo de Minas Gerais. Lamentavelmente, sabemos que ele conseguiu se eleger.

Em 2012, surge o escândalo envolvendo Rosemary Noronha. Fiuza a chama de “a mulher do ano”. “Por que só Dilma é ícone feminino, se Rosemary mostrou ser um prodígio da mesma escola?” Enquanto isso, Ricardo Lewandowski e José Antonio Dias Toffoli formam a dupla Batman e Robin do PT no Supremo.

O livro inclui a coluna Lula privatizou a si mesmo, sobre o pedido do Ministério Público Federal à Polícia Federal para que fosse aberto um inquérito contra Lula, com base na denúncia de Marcos Valério de que o ex-presidente teria intermediado um repasse de sete milhões de reais de uma operadora de telefonia para o PT. Publicada em julho de 2013, motivou um processo do PT contra Fiuza, por danos morais. Recentemente, o PT propôs uma audiência de conciliação sobre o caso, mas o jornalista não aceitou.

O livro segue com os protestos de 2013, a Primavera Burra, com os rolezinhos e com a morte de Santiago Andrade. Fiuza convida a Ministra dos Direitos Humanos, Maria do Rosário, a trocar as lentes dos seus óculos num shopping socialmente ocupado por um rolezinho. O “Brasil bonzinho”, que tolera arruaças de boçais mascarados, foi o responsável pelo assassinato do cinegrafista da Band. “Deputados bonzinhos, intelectuais do bem e artistas antenados gritaram alto pela liberdade dos presos em manifestações.” “Esse Brasil progressista que matou Santiago se permitiu hesitar diante da afronta ao estado de direito. Confundiu atentado com protesto e resolveu (embora jamais vá confessar isso) relativizar a violência. Assassino.”

Guilherme Fiuza previu que Dilma seria reeleita. Ainda estou tentando entender como ou por quê. Seja como for, precisamos defender a liberdade que ainda temos.

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