Há um ano, meu pai subiu em uma escada de pedreiro para limpar uma luminária, na frente da casa dele. A escada resvalou para o lado e ele caiu de uma altura de três metros. Quebrou a bacia, foi internado, teve uma infecção hospitalar e faleceu depois de 32 dias.
Era a sexta-feira depois do Corpus Christi. Eu nem deveria estar trabalhando naquele dia, mas, na quarta, devido a alguns problemas urgentes, decidi ir para a empresa na sexta. Estava indo almoçar, muito atrasado, não lembro por que, quando minha mãe ligou. Ele já estava internado. Almocei assim mesmo, avisei os colegas do que tinha acontecido e corri para o hospital. Não vou repetir aqui cada passo da sua agonia, embora tudo volte a mente hoje.
Tínhamos planejado, meus pais e eu, visitar uma tia no dia anterior, mas ela desmarcou porque não estava bem de saúde. Nada me convence de que, se tivéssemos feito essa visita, meu pai não teria subido naquela escada no dia seguinte. (Mas poderia ter subido em qualquer outro momento, eu sei.)
Quando vou a um lançamento de livro, penso sempre “Papai iria gostar de ler este aqui.” Estou conversando com alguém sobre histórias antigas de família, ou sobre algum assunto que meu pai estudou e penso “Papai sabia isso. Agora, não tenho para quem perguntar.”
Meu pai pediu que eu procurasse citações das Metamorfoses, de Ovídio. Foi talvez a última coisa que ele me pediu. Li as Metamorfoses recentemente. Li também a Anábase, de Xenofonte, que ele mencionava sempre. E publiquei aqui o Crepúsculo Sertanejo, de Castro Alves, que ele gostava de recitar. É uma forma de continuarmos conversando.
Vejo meus filhos e sei que eles são as pessoas mais parecidas comigo que existem. Talvez eu seja a pessoa mais parecida com ele, embora em tantas coisas fôssemos muito diferentes.
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